segunda-feira, 27 de junho de 2022

OUVIDO NO CORAÇÃO DE DEUS: O DESAFIO DE MEDITAR NO MEIO DO MUNDO

 


Enfrentando as dificuldades para conseguir fazer a oração meditativa

No último artigo, falamos da importância que o Pe. Kentenich dava à meditação da vida diária como uma escola de amor, como a forma de nos encontramos com Deus em nosso dia a dia. Porém sabemos que, quando tentamos mudar o ritmo da nossa vida para dar lugar a uma dimensão mais contemplativa, encontramos inúmeras dificuldades para colocar na prática.

Decidir meditar

O nosso primeiro passo precisa ser a decisão por incluir a prática da meditação em nossa vida. Precisamos entender que essa pequena parada durante o nosso dia para tentarmos enxergar Deus se comunicando conosco é essencial para conseguirmos uma maior intimidade com Ele. Ou conseguimos encontrar a Deus nas criaturas, nas coisas e no trabalho ou simplesmente esse Deus da vida se torna inalcançável. Podemos até ter um contato com Ele quando vamos à igreja ou fazemos uma oração, mas o resto do dia, vivemos, por assim dizer, como um pagão.

Devemos buscar não somente ao Deus transcendente, que está no Céu e ouve nossas orações ou se alegra quando participamos do Santo Sacrifício da Missa e fazemos comunhão com Ele, mas também ao Deus que é a Causa Primeira de tudo, que tudo criou e colocou à nossa disposição e deseja, através das Causas Segundas (as pessoas e tudo o que foi criado) se encontrar conosco demonstrar o seu amor infinito para cada um de nós

Não desistir frente às dificuldades

Depois de entendermos a importância da meditação e nos decidirmos a realizá-la, podemos nos sentir desanimados ao darmos conta dos imensos desafios que se colocam em nosso caminho e todas as forças do nosso mundo materialista que querem nos impedir de olharmos para dentro de nós e para buscarmos Deus em nossa vida. Podemos ter algumas tentativas falhas de meditar, e então nos damos por vencidos. Pensamos que a meditação não é para nós...

“Há quem pense que a oração meditativa está reservada para os sacerdotes e religiosos. Os leigos, mais ainda, os simples trabalhadores, não seriam capazes e nem estariam chamados a de fazê-la. Todavia, este é um grande erro. Não somente há santos da vida diária atrás dos muros conventuais, não somente há santos que usam hábitos religiosos, mas também e principalmente em trajes seculares, em meio do emaranhado e das lutas da vida cotidiana. Eles são encontrados em todas as vocações e estados de vida.” (P. J. Kentenich)

Meditar num mundo tão agitado como o nosso realmente é uma tarefa heroica e se não tivermos um método adequado e constância nessa atitude, contando com a ajuda do Espírito Santo, será praticamente impossível consegui-lo. O Pe. Kentenich dizia que uma das virtudes que ele mais admirava era a fidelidade. A fidelidade de recomeçar a cada queda, a cada fracasso. Então não devemos desanimar se não conseguirmos logo colocar a meditação em prática, mas sempre ter a coragem de tentar novamente.

Pedir auxílio ao Espírito Santo

Assim, precisamos implorar a graça do alto, especialmente os dons do Espírito Santo. Podemos pedir a poderosa intercessão de nosso Santo Anjo da Guarda. Ele é um ser muito poderoso que nos foi presenteado por Deus para nos guardar, iluminar e conduzir ao Céu. Ele sabe da importância de nosso contato mais íntimo com Deus para chegarmos lá, então quer nos ajudar a colocarmos em prática a meditação.

Como ensina o Pe. Rafael Fernández: “O objetivo próprio da meditação é aprofundar e tornar mais íntima nossa relação de amor com Deus. Se meditamos uma ideia, é para degustar a verdade ou realidade que esta representa, a fim de que, além do nosso intelecto, penetre em nosso coração. Porque quando se trata de nosso vínculo de amor com Deus, e do amor que Ele tem por nós e que espera que nós lhe devolvamos, não bastam conceitos nem meras ideias. (...)

A meditação é como a raiz da árvore. O que sustenta as árvores, quando vem tormentas e tempestades, não é a copa nem as folhas, mas as raízes. Quanto mais profundas são as raízes de uma árvore, mais capacidade ela tem de superar os embates do tempo. Inclusive, as tormentas as vão afirmando, porque suas raízes vão se fincando na profundidade. O vento pode lhes arrancar um tanto de galhos e folhas, mas a árvore continua de pé. Porém, quando as raízes são escassas, mesmo que tenha uma folhagem muito frondosa e um grande tronco, facilmente um temporal a derrubará. A meditação nos arraiga no coração de Deus.”

Como meditar?

A prática da meditação da vida diária ensinada pelo Pe. Kentenich possui algumas etapas. A primeira etapa é a preparação. Existe a preparação remota, a preparação próxima e a preparação imediata. Depois vem o desenvolvimento da meditação, com o início, desenvolvimento e conclusão.

Nos próximos artigos, explicaremos detalhadamente cada uma dessas etapas inclusive com exercícios práticos de meditação, porém, colocamos aqui um panorama geral, um resumo de como a meditação funciona:

Escolher um horário do dia no qual realizará a meditação. Pode ser, no início, cerca de 10 a 15 minutos. Podemos começar fazendo uma vez por semana, e depois, gradativamente, aumentando a frequência.

Escolhemos um lugar adequado, onde não seremos interrompidos. De preferência, com alguma cruz ou imagem que nos remeta à realidade sobrenatural. Fechar um pouco os olhos, respirar calmamente e nos colocar na presença de Deus, então fazemos uma oração implorando as luzes do Espírito Santo.

Em seguida, escolher sobre o que se vai meditar. Se ainda somos iniciantes nessa prática, é mais fácil escolher uma passagem bíblica ou um trecho de uma oração. Depois, com a prática, pode ser um acontecimento da vida (uma situação concreta de nossa vida), que é efetivamente a meditação da vida diária proposta pelo Pe. Kentenich.

O Pe. Kentenich propõe três perguntas que constituem uma excelente ajuda para desenvolver esse encontro com o Senhor:

1. O que Deus quer me dizer com isso? (através desse texto ou desse fato ou circunstância)

2. O que digo a mim mesmo?

3. O que respondo a Deus?

A pergunta mais importante é esta última. É nela que entramos na oração meditativa. Quando falamos de resposta, não significa necessariamente uma ação ou propósito, mas de uma resposta “de amor”, uma resposta do coração, falando pessoalmente com o Senhor. Expressamos nosso amor de gratidão, de arrependimento, de pedido. Terminamos a meditação com uma oração de ação de graças. É conveniente anotar em um caderno pessoal sobre o que meditamos e o que foi mais importante para nós na meditação.

Além de agradecer ao Senhor e a Nossa Senhora pela meditação (ou pedir perdão se não a realizamos bem), as vezes podemos concluir com alguma intenção ou propósito que venha ao encontro do que meditamos. Assim, pouco a pouco, com a dedicação de alguns momentos por dia para meditar, vamos aumentando nosso amor e nossa vinculação ao nosso Pai do Céu que nos ama com amor infinito.

Caso você tenha alguma dúvida ou comentário sobre a prática da meditação da vida diária, pode enviar sua pergunta para o email: ouvidonocoracaodedeus@gmail.com

Photo by Ümit Bulut on Unsplash

segunda-feira, 20 de junho de 2022

OUVIDO NO CORAÇÃO DE DEUS


 

Aprender a enxergar o que Deus quer me falar no dia a dia

O nosso mundo atual nos compele a viver num ritmo frenético. Tudo deve ser instantâneo, ao alcance de um clique. Vivemos de uma atividade a outra, quase sem pausa e quando paramos para “descansar”, normalmente nossa mente está olhando uma tela, com uma enxurrada de informações, imagens, vídeos. São poucos os que escapam a essa realidade. A grande maioria de nós vive pressionada por todo tipo de exigências, tentando responder as obrigações matrimoniais e familiares, os requerimentos do trabalho e, para muitos também, aos múltiplos compromissos apostólicos.

Esse ritmo de vida pode causar uma série de doenças “modernas”, como a síndrome do burnout, ansiedade, depressão. Mesmo aqueles que escapam de ficarem doentes, eventualmente anseiam por uma paz maior. Às vezes um acontecimento, como a morte de alguém querido, nos tira um pouco desse turbilhão em que vivemos e paramos para pensar: para que tudo isso? Qual é o sentido da minha existência?

Para conseguirmos responder a essas questões e nos confrontar com o que dá o sentido verdadeiro a nossa vida, precisamos de espaços que nos permitam encontrar conosco mesmos e que nos conduzam a um contato mais profundo com Deus, pois só Ele possui as respostas que precisamos.

O Pe. José Kentenich tinha uma preocupação constante em conduzir o ser humano atual até um encontro com o Deus vivo através das criaturas e das circunstâncias concretas que o rodeiam. Para ajudar nesse encontro vital com o Senhor, desenvolveu uma prática de meditação, a chamada “meditação da vida diária”, que vem responder a esse anseio e essa necessidade.  

Para o homem moderno é extremamente difícil compreender e praticar a meditação, pois a forma que organizamos nossa vida está muito orientada para o exterior, para o fazer, produzir, fabricar, organizar e racionalizar. Vivemos em uma cultura marcara com o selo da extroversão.

A falta do cultivo da vida interior (o Pe. Kentenich fala de uma cultura sem alma) afeta o ser humano em vários aspectos de sua pessoa, inclusive no tocante à profundidade de sua fé. Recebemos a semente da fé em nosso Batismo, porém ela precisa ser cultivada para se desenvolver e se tornar um suporte para a nossa vida. Esse cuidado se dá através do contato íntimo e pessoal com o Senhor e sem ele, a fé pode morrer.

O Pe. Kentenich se preocupava também com isso, para que seus filhos espirituais tivessem uma plena confiança no Pai, através de uma “fé prática na divina providência”. Porém, o ser humano só consegue confiar em quem conhece e para conhecer, precisamos passar tempo juntos. Além disso, é importante conseguir enxergar os inúmeros cuidados que Deus tem conosco a cada dia, demonstrando seu amor infinito por nós.

Como alcançar uma vida mais harmônica? Como aprender a parar e deixar de ‘sermos vividos’ pelos acontecimentos? Como fazer que nossa vida de fé seja mais aprofundada e que nosso contato com Deus seja mais pessoal?

O Pe. Kentenich nos dá a resposta: meditação da vida diária. Diz ele:

“Nosso método preferido de meditação consiste em revisar e saborear, em revisar com antecedência e saborear depois. Isto deveria ser entre nós uma atitude permanente, um hábito. A partir de cada realidade, por mais íntima que esta seja, devemos saber subir até o coração misericordioso e bondoso de Deus Pai. Enquanto isso não tenha se convertido em uma segunda natureza para nós, queremos exercitar mais e mais até consegui-lo.

Queremos ingressar na escola de amor, da oração interior. Não estamos orientados somente por esta forma de meditação. Podemos aplicar também outros métodos de meditação. Porém, dada a importância que reveste introduzir ao Deus na vida em nossa vida, nos encontrarmos com o Deus da vida em nossa vida e responder a ele a partir de nossa vida, então, penso que, por um certo período, nossa ocupação predileta deve ser revisar e descobrir, no tempo dedicado à meditação, onde Deus veio ao nosso encontro no dia de ontem.”

O Pe. Rafael Fernandéz, em seu livro “Como aprender a meditar?”, explica “O Fundador está pensando em um método de meditação especialmente apto para as pessoas que estão chamadas a encontrar a Deus no meio do mundo, através das criaturas. Ou seja, um método para quem não pode nem deve abandonar as realidades desse mundo: sua família, seu cônjuge, seus filhos, seus negócios e tudo o que isso implica, para se retirar e contemplar a Deus na solidão.

Esse é o pano de fundo da meditação da vida diária como o Pe. Kentenich a concebe. Ele quer nos dar um caminho que nos leve a entrar em comunhão com o Deus providente, que nos ensine a descobrir e comungar não só com o Cristo presente nos Evangelhos, mas com o Cristo presente na história, em nossa história pessoal e nos acontecimentos do mundo.

De nenhuma forma essa acentuação deixa de lado o Deus da Eucaristia ou o Deus presente na Palavra. Mas sim, integra e destaca com força o Deus da vida”.

Essa forma de meditação não é como uma análise, um estudo de algum aspecto da doutrina ou dos ensinamentos da Igreja, para que tenhamos um conhecimento maior sobre o tema. O objetivo da meditação da vida diária não é saber ou conhecer mais, mas amar mais através do aprofundamento de nosso vínculo de amor pessoal com Deus.

“A meditação deveria se tornar uma escola de amor por eminência. Esse é o costume que deveríamos adquirir. Não uma escola de ciência, assim não é um estudo propriamente dito, mas uma escola de amor. Se quiserem saber se meditaram bem, devem se perguntar apenas: na meditação aprendi a amar, a amar de forma correta? (P.K.)

A partir de hoje, iniciaremos uma série de artigos para desenvolver o tema da meditação da vida diária e assim aprendermos a colocar em prática essa grande riqueza ensinada pelo Pe. Kentenich. Caso tenha alguma dúvida ao longo dos artigos, pode enviar uma mensagem para o email: ouvidonocoracaodedeus@gmail.com

Photo by Marcos Paulo Prado on Unsplash