Continuando nossa série de
artigos sobre a meditação da vida diária, conforme ensinado pelo Pe. Kentenich,
hoje trataremos do tema da preparação para a meditação. “O enfoque de nosso
Pai e Fundador é meditar onde nos encontramos com Deus e como nos
encontramos com Deus”, nos explica o Pe. Humberto Anwandter.
Para perceber esse atuar de Deus
em nossas vidas é preciso nos deter, parar para contemplar, para nos
encontramos com o Pai, que, como diz a fé prática na divina providência, cuida
de todos os acontecimentos da história mundial, mas também da história da minha
vida. Todo encontro mais pessoal e profundo, exige uma certa preparação. Ainda
mais vivendo da forma agitada como acontece em nosso mundo, seria ilusão pensar
que é possível passar da plena atividade diretamente para um diálogo íntimo com
Deus.
Assim, existe uma tríplice
preparação para a meditação: a preparação remota, a preparação próxima e a
preparação imediata.
Preparação remota
A preparação remota diz respeito a
algumas atitudes prévias que precisamos conquistar para conseguirmos fazer uma
boa meditação. A primeira delas é reservar um tempo para meditar, pois
todo encontro de amor requer um tempo. E não basta dizer: “amanhã farei meus 15
minutos de meditação”. Isso é muito vago e nossa tendência é procrastinar.
Então o ideal é efetivamente marcar um horário na nossa agenda, por exemplo,
das 08:00 às 08:15 e cumprir esse horário.
Como nossas agendas normalmente
são muito cheias, reservar esse tempo para meditação pressupõe deixar alguma
coisa de lado. Como diz o Pe. Rafael Fernandez: “Sejamos realistas: sem
renúncia ou um melhor ordenamento de nossa agenda diária, não será possível
contar com o tempo necessário para um encontro mais profundo com o Senhor.
(...) Se não damos espaço aos ‘encontros de amor’ com Deus; se não cultivamos
nosso amor a Ele, então nosso contato pessoal com Ele também irá esfriar, se
tornará cada vez mais distante e impessoal, até desaparecer. (...) Dar um
espaço para a meditação impede que isso aconteça.”
Para nos introduzirmos na prática
da meditação é necessário também possuir uma capacidade contemplativa,
ou seja, a capacidade de assombrar-se e maravilhar-se diante das coisas. É
similar a capacidade que crianças possuem de olhar, por exemplo, uma borboleta
e se encantar com os seus movimentos, suas cores, o bater de suas asas...
Em geral nós olhamos as coisas e
as pessoas de um ponto de vista de sua utilidade prática, nos colocando no
centro. Além disso o excesso de estímulos que recebemos diariamente através das
diferentes telas (celular, computador, televisão), nos atrapalha a parar para
observar e admirar as coisas e as pessoas que nos cercam.
Precisamos aprender a “nos
deter ante a realidade que nos rodeia; a reparar nos detalhes; ir mais além da
superfície; a contemplar em seu conjunto e em seu significado o que observamos,
seja uma coisa, uma pessoa ou um acontecimento”, nos ensina o Pe. Rafael
Fernandez. Para isso precisamos, aos poucos, ir treinando o nosso olhar e
começar a fazer esse pequeno exercício de contemplação, um pouquinho a cada
dia.
Mais um passo importante da
preparação remota é dar espaço aos valores do coração. Como dizia S.
João Paulo II fomos criados para amar, não simplesmente para produzir ou
organizar. O Pe. Kentenich também insistia na importância do organismo de
vinculações, ou seja, o cultivo dos vínculos de amor pessoais, tanto na
ordem natural como na sobrenatural. A meditação, como escola de amor, como meio
de aprofundar nossa vinculação pessoal a Deus, nos ajuda a desenvolver e
fortalecer essa capacidade de amar que é infundida, como semente, em nosso ser.
Por fim, é necessário também reavivar
nossa fé na divina providência, pois através da meditação queremos nos
encontrar com Deus, por isso é imprescindível ter fé em Deus. Então tudo o que
afirma e fortifica nossa fé, redunda em uma maior possibilidade de encontrar a
Deus na meditação. Os meios que podemos utilizar para aumentar a nossa fé são
os sacramentos, especialmente o da confissão e o da eucaristia, além da leitura
da Palavra de Deus. É importante lembrar que devemos sempre rezar
pedindo para aumentar a nossa fé. Essa é a única oração que podemos ter plena
certeza que será atendida imediatamente.
Preparação próxima
O Pe. Kentenich ensina que a
preparação próxima para a meditação são nossas práticas espirituais, o que ele
denomina de “pausas criadoras” de oração (momentos curtos nos quais
elevamos nosso espírito ao Senhor) no meio do dia de trabalho.
A oração é a “respiração da
alma”, assim se não rezamos, nosso espírito morre, perdemos o contato com o
mundo sobrenatural. Pensamos em primeiro lugar na oração da manhã e na oração
da noite, que devem ser feitas de maneira bem consciente, oferecendo todo nosso
dia de trabalho e depois agradecendo o dia que passou. O livro de orações Rumo
ao Céu tem a oração da manhã (RC 3 – 17) e a oração da noite (RC 357 – 385)
escritas pelo próprio Pe. Kentenich e que podemos usar em nosso dia a dia.
Além dessas orações que marcam o
início e o fim de cada dia, devemos complementar com as “pausas criadoras”,
essas pequenas demonstrações de amor e carinho com Deus, com as pessoas do
mundo sobrenatural. Elas podem ser feitas com as jaculatórias, que tem origem
do latim e significam “flechas atiradas”. Assim, as jaculatórias são como
flechas de amor que atiramos para o Céu, para atingir o coração de Deus. Alguns
exemplos de jaculatórias: “Jesus eu confio em Vós”; “Ave Maria por tua pureza
conserva puro meu corpo e minha alma”; “Oh Maria concebida sem pecado, rogai
por nós que recorremos a vós”, etc. Você pode criar sua própria jaculatória
favorita ou simplesmente ao longo do dia, dizer: “Jesus eu te amo”.
“As pausas criadoras,
intercaladas com os afazeres cotidianos, tal como as concebe o Pe. Kentenich,
são uma ajuda privilegiada que nos permite manter viva a presença e o amor de
Deus em meio às nossas atividades.” (P. Rafael Fernandez)
Outra prática que pode constituir
uma “pausa criadora” é cumprimentar a Jesus Eucarístico sempre que passamos em
frente a uma Igreja. Ou até desviar um pouco o caminho que fazemos para
propositalmente passar em frente a uma Igreja só para poder falar “oi” pra
Jesus, com um sinal da cruz.
“Como o pássaro não abandona
seu ninho, nosso amor gira ao redor dos tabernáculos sagrados. Onde a lâmpada sagrada flameja e não se apaga, nossas almas ardem
por desposar-se contigo”
(RC 163-164).
Mais exemplos são: olhar um
crucifixo, saudar uma imagem de Maria ao entrar ou sair de casa, ou quando
mudamos de atividade; uma comunhão espiritual; beijar nossa medalha de
consagração, etc. Pe. Rafael Fernandes nos ensina que “a forma e o conteúdo
dessas pequenas pausas criadoras dependem de nosso temperamento e de nossa
relação com Deus.”
Por fim, o Pe. Kentenich destaca
a importância do momento em que nos dispomos a dormir: “A preparação para a
meditação é, talvez, o mais importante. Começa pela noite, na preparação que
fazemos durante a oração da noite; sua culminância está nos minutos antes de
dormir. Pouco antes de dormirmos deveríamos ter claro quando e para que
vamos nos levantar na manhã seguinte.”
Preparação imediata
A preparação imediata se refere
ao momento da meditação propriamente dita. A primeira coisa necessária é um
lugar adequado, para podermos nos encontrar com o Senhor, devendo ser uma
atmosfera propícia para esse encontro. A realidade de cada pessoa é que vai
determinar esse lugar, podendo ser seu próprio quarto ou seu escritório, antes
de começar o trabalho, ou uma igreja ou o próprio Santuário ou seu
Santuário-lar. O mais importante é que o local escolhido nos assegure um grau
razoável de tranquilidade.
“Todo encontro de amor requer
um contexto e um ambiente adequados” nos diz o P. Rafael Fernandez, assim
ajuda a entrarmos nessa atmosfera de meditação se tiver uma imagem religiosa,
algum símbolo, uma vela, etc, ou seja, coisas que ajudem nossos sentidos a nos
colocarmos em contato com o mundo sobrenatural.
É necessária também uma postura
corporal adequada, seja ela sentada, em pé ou ajoelhada. Todavia se a
postura que escolhemos nos causa um certo desconforto que atrapalha nossa
concentração, então ela não é adequada.
Por fim, o tempo que
escolhemos para meditar é importante e depende da realidade de cada um. Para
alguns, o melhor é logo de manhã, para outros, o período noturno é o mais
apropriado, outros ainda, preferem uma pausa no meio do dia. O que conta é que
seja um tempo apto para realizarmos nosso propósito de meditação, assim não
podemos estar muito cansados, com sono ou preocupados com os afazeres.
Com relação a duração da
meditação, no início pode ser de 10 a 15 minutos e depois, conforme fomos
adquirindo o hábito, pode passar a ser de 20 a 30 minutos.
“Por que acontece com
frequência que simplesmente não conseguimos meditar? Uma causa pode ser o
desconhecimento da verdadeira oração. Muitos pensam que o sentido de uma oração
autêntica está no trabalho da cabeça. Isto não está certo. O mais importante é
que a vontade e o coração estejam entregues a Deus. Outra razão é a falta de
magnanimidade. Buscamos com uma unilateralidade demasiada o consolo de Deus e
não o Deus do consolo. Pensamos que se não sentimos consolo nenhum, a prática
da oração é uma perda de tempo. Outra causa reside no fato de que damos pouca
importância à preparação remota. Nossa vida deve possuir o seguinte ritmo: os
tempos de oração são a oração antecedente, a vida prática é a oração
consequente. Durante o dia devo cuidar para me desprender, por manter meus
sentidos em recolhimento, por conservar uma atitude humilde perante Deus. Se
não faço isso, seria um verdadeiro milagre que minha meditação fosse boa. Digo
mais uma vez: quem vive a santidade da vida diária protege qualitativamente as
práticas de oração.” (P. Kentenich)
Caso você tenha alguma pergunta ou comentário sobre a prática da meditação da vida diária, pode enviar para o email: ouvidonocoracaodedeus@gmail.com
Photo by Olivia Snow on Unsplash
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