quarta-feira, 9 de maio de 2018

DA CASTIDADE NASCE O AMOR


Castidade e amor, duas palavras tão mal interpretadas nos dias de hoje. Castidade normalmente está relacionada com repressão, falta de liberdade, puritanismo. E o amor muitas vezes é confundido com paixão, sexo, sentimento espontâneo que não exige esforço. Porém, existe uma íntima relação da castidade, entendida como a capacidade de adiar a satisfação de um desejo, com o amor conjugal verdadeiro e duradouro, que pode ser entendido como a capacidade de sacrificar a si mesmo para o bem e a felicidade do outro.

A natureza humana é tanto animal como espiritual. Possuímos corpo e espírito. O nosso corpo, para se manter vivo, possui alguns instintos básicos, como se alimentar, descansar e se reproduzir. O instinto sexual, portanto, faz parte da nossa natureza, porém, ao contrário dos outros animais, que não tem espírito e por isso não tem a capacidade de controlar seus instintos, deve ser conduzido para a realização plena (corpo e espírito) e não apenas para a satisfação imediata do corpo.

Todos temos o anseio por nos realizarmos, por sermos felizes e essa realização pessoal vai muito além da realização de nossos instintos físicos. Não basta estarmos alimentados, vestidos, descansados para nos sentirmos realizados. A realização espiritual do ser humano só acontece na medida em que se sente útil, importante, que faz diferença. E isso só se dá através dos relacionamentos que construímos durante nossa vida. O ser humano é um ser que precisa se relacionar, não foi criado para viver isolado.

O amor é a forma mais sublime do relacionamento humano, pois vai muito além de querer bem o outro, ou se alegrar com a companhia. O amor verdadeiro nos impulsiona a desejar fazer o outro feliz e somente amando dessa forma, nos livrando do egoísmo que quer nos aprisionar em nossos próprios desejos, é que nos sentimos realizados. Mas como aprendemos a amar dessa forma?

Vamos falar aqui especificamente do amor conjugal. Os outros tipos de amor (materno/paterno, filial, de amizade, etc) também precisam sem aprendidos, mas a forma é um pouco diferente e podemos falar disso em outro post. O amor não é instinto, precisa ser ensinado e aprendido. O instinto relacionado ao amor conjugal é o da atração para a satisfação do desejo sexual. Esse desejo sexual pode ser de três tipos: “vênus”, “eros” e reprodutivo.

O desejo tipo “vênus” é aquele mais animal, que quer o corpo do outro para a própria realização. Aqui não importa a pessoa, com suas qualidades intelectuais e afetivas, apenas o seu corpo. É o instinto mais primitivo.

O desejo tipo “eros” (ou cupido), é o “filho de vênus”, ou seja, parte desse primeiro instinto que quer só o corpo, para desejar também a alma, os sentimentos, os afetos. É a paixão, que envolve a pessoa como um todo.

Porém, “vênus” e “eros” ainda não estão completos, porque quando o relacionamento com a pessoa ultrapassa a fase da paixão, amadurece e quer ver aquele sentimento prolongado no tempo, através dos filhos. Assim, para chegarmos ao verdadeiro amor conjugal, a pessoa precisa, através do uso da razão, saber administrar esses três tipos do desejo sexual.

E é aqui que entra a castidade. Qualquer instinto primário que é imediatamente satisfeito, gera um certo repúdio para aquilo que o satisfez. Se estamos com muita fome e comemos um enorme prato de feijoada, estando satisfeitos não conseguimos nem mais olhar para o prato de comida. O mesmo acontece com o desejo “vênus”. Se a atração pelo corpo é satisfeita logo com a relação sexual, o natural é que, em breve, esse “corpo” que me satisfez me cause repulsa. E aí vou procurar outro corpo que me satisfaça, entrando num ciclo vicioso que jamais irá me realizar plenamente.

Adiar a satisfação do desejo sexual gera o interesse pela pessoa e não só pelo corpo. A castidade faz com que o instinto saia da fase puramente animal e se torne mais humano. O interesse passa a ser para uma pessoa específica, essa que me atraiu primeiramente pelo corpo, mas em virtude da castidade, fez com que me interessasse também pelo espírito.

A castidade permite ainda que a pessoa passe a considerar a satisfação do instinto sexual reprodutivo, ou seja, ter filhos com a pessoa amada e ajuda os dois a enxergarem que a forma mais adequada de satisfazer esse instinto é através do casamento. O casamento é um compromisso assumido publicamente que deve garantir a união daquele homem e daquela mulher, por toda a vida. Uma união exclusiva que tem como finalidade o bem dos filhos.

Os filhos são a prova que os dois se tornaram uma só carne. Com os filhos aprendemos a nos doar totalmente para o outro, sem esperar nada em troca. Aprendemos a amar de verdade, a nos sacrificarmos pelo bem do outro. Amando os filhos, aprendemos cada dia a amar mais o cônjuge.


E esse amor verdadeiro nasce da castidade. Sem a castidade, nos tornamos cada vez mais egoístas, pensando apenas na própria realização, em usar o outro para o meu prazer. Essa atitude a longo prazo (às vezes nem tão longo assim) traz frustação e infelicidade. Ser casto não é ser reprimido. Ser casto é aprender a controlar uma satisfação imediata tendo em vista a felicidade futura. Aprender a ser casto é aprender a amar. 

photo credit: taylormackenzie <a href="http://www.flickr.com/photos/34442610@N06/32526976670">Cupid's lunch break</a> via <a href="http://photopin.com">photopin</a> <a href="https://creativecommons.org/licenses/by-sa/2.0/">(license)</a>

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