quinta-feira, 9 de outubro de 2014

EDUCAÇÃO PARA LIBERDADE E AUTONOMIA - PARTE 2

Na prática, esta educação para a autonomia e liberdade significa ensinar o filho, desde pequeno, a agir conforme sua inteligência determina e não apenas “reagir” aos seus instintos e vontades. A inteligência, a razão da criança necessita ser treinada para conseguir dominar a vontade, os desejos, para que ela seja realmente uma pessoa livre e autônoma, que consegue agir de acordo com o que acredita ser correto.
Um exemplo simples: a criança quer comer um doce a poucos minutos da hora do almoço. Os pais têm que explicar a ela que não pode comer o doce naquele momento, porque irá diminuir o apetite dela para a refeição e ela precisa se alimentar corretamente para ter saúde. Assim, apesar de ser bom comer um doce, pois irá obter o prazer que ele proporciona ao sentido da degustação, naquele momento não é um bem, ou seja, a inteligência distingue que para o corpo ser saudável, precisa se alimentar melhor na hora do almoço, desta forma não deve comer doce naquela hora.
Se o filho aprende desde cedo a renunciar um prazer para obter um benefício maior, utilizando sua inteligência para dominar a sua vontade, quando precisar renunciar as drogas, bebidas ou outros prazeres ilícitos, terá força para fazê-lo e assim será realmente uma pessoa livre.
“Se é um pouco cansativo exercer a autoridade deste modo, lembrem-se de que é para o bem dos filhos: a pior tirania que os filhos poderiam vir a sofrer seria a incapacidade de se controlarem a si mesmos. Nada causa maior angústia aos adolescentes do que sentirem-se incapazes de dominar algum aspecto da sua vida.”[1]
A educação para a liberdade e autonomia supõe também uma educação para os valores e para a verdade. “Cristo revela, antes de mais, que o reconhecimento honesto e franco da verdade é a condição para uma autêntica liberdade: ‘Conhecereis a verdade e a verdade vos tornará livres’(Jo 8,32) [2]. Para que os filhos consigam distinguir o que é um bem para eles, sua inteligência precisa ser alimentada com os valores corretos e com a verdade e isso é tarefa primordial dos pais.
Os valores são “tudo aquilo que nos ajuda a crescer em nosso ser, do físico ao espiritual, que contribui para desenvolver nossas capacidades e qualidades, que nos enriquece interiormente, que nos leva a sermos mais e a sermos melhores.”[3]Se os filhos possuem os valores adequados, suas atitudes refletirão os valores que possuem.
A verdade deve ser um dos maiores valores cultivados pela família. O engano e a mentira podem destruir a família. Nunca se deve mentir para os filhos, pois a verdade um dia é revelada e os filhos, então, não confiarão mais em seus pais. Não existe mentira “inocente”, faltar com a verdade é sempre prejudicial. Mesmo que falar a verdade possa ser mais trabalhoso para os pais, este cuidado é fundamental na educação dos filhos.
Muitas vezes se observa que os pais mentem para os filhos simplesmente para evitar ter trabalho ou para convencer os filhos a fazerem o que eles querem e acreditam que uma “mentirinha” não faz mal para ninguém. Exemplifica-se: a criança já comeu muito doce e continua insistindo por comer mais. Os pais, ao invés de manterem-se firmes na posição de que ela não pode mais comer porque fará mal a sua saúde e suportarem a insistência da criança, mentem dizendo que o doce acabou. Desta forma, além da mentira, perdem a possibilidade de educar a vontade do filho no sentido dele saber que o doce está lá, mas não pode comer mais. 
Outro exemplo é dizer para a criança que uma injeção que ela precisa tomar não vai doer, para que a criança não faça “birra” e aceite mais tranquilamente receber a injeção. No minuto que ela sentir a dor, que obviamente acontecerá, passará a desconfiar da palavra dos pais e se sentirá enganada, o que efetivamente aconteceu. O correto seria dizer que, sim, ela irá sentir um pouco de dor, mas esta dor é necessária para o bem dela, pois o remédio ajudará a melhorar.
Assim, a mentira nunca pode ser aceita, pois quebra a confiança entre pais e filhos. Não é possível exigir do filho que não minta para os pais se os próprios pais sempre mentiram para a criança, mesmo estas ditas “mentirinhas”.
É ensinamento bíblico: “O pai de vocês é o diabo (...). Quando ele fala mentira, fala do que é dele, porque ele é mentiroso e pai da mentira.”[4]Toda vez que se diz uma mentira, está se comportando como filho do inimigo de Deus e trazendo desconfiança e discórdia para dentro do lar.
 A palavra chave para obter a verdadeira liberdade e autonomia é a virtude da temperança.
  “A temperança é a virtude moral que modera a atração pelos prazeres e procura o equilíbrio no uso dos bens criados. Assegura o domínio da vontade sobre os instintos e mantém os desejos dentro dos limites da honestidade. A pessoa temperante orienta para o bem os seus apetites sensíveis...”[5]
Portanto, não se trata de afastar todos os prazeres e abafar todos os instintos, muito pelo contrário, a liberdade é alcançada na medida em que o indivíduo encontra este equilíbrio entre o que pode e o que deve fazer em todas as circunstâncias da sua vida, buscando o próprio bem e o bem daqueles que o cercam, evitando que suas atitudes causem um dano físico, moral ou espiritual a si mesmo ou ao próximo[6].
"Os pais são os primeiros responsáveis pela educação de seus filhos. Dão testemunho desta responsabilidade em primeiro lugar pela criação de um lar no qual a ternura, o perdão, o respeito, a fidelidade e o serviço desinteressado são a regra. O lar é o lugar apropriado para a educação das virtudes. Esta requer a aprendizagem da abnegação, de um reto juízo, do domínio de si, condições de toda liberdade verdadeira. Os pais ensinarão os filhos a subordinar ‘as dimensões físicas e instintivas às dimensões interiores e espirituais’”.[7]



[1] “Filhos: quando educá-los?”, STENSON, James B. Pg. 41-42, 2ª edição, Editora Quadrante, São Paulo, 1994
[2] Carta Encíclica de João Paulo II, Veritatis Splendor, No. 87
[3] “Uma educação integral baseada em valores”, TOALDO, Olindo e Marilene, Série Educação 7, pg. 11, Sabta Maria, 1990
[4] Jo 8,44
[5] CIC 1809
[6] “Autodominio – Elogio da Temperança”, FAUS, Francisco, pg. 31, editora Quadrante, São Paulo, 2004
[7] CIC 2223

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