Na prática, esta educação para a autonomia e liberdade significa ensinar
o filho, desde pequeno, a agir conforme sua inteligência determina e não apenas
“reagir” aos seus instintos e vontades. A inteligência, a razão da criança
necessita ser treinada para conseguir dominar a vontade, os desejos, para que
ela seja realmente uma pessoa livre e autônoma, que consegue agir de acordo com
o que acredita ser correto.
Um exemplo simples: a criança quer comer um doce a poucos minutos da
hora do almoço. Os pais têm que explicar a ela que não pode comer o doce
naquele momento, porque irá diminuir o apetite dela para a refeição e ela
precisa se alimentar corretamente para ter saúde. Assim, apesar de ser bom comer um doce, pois irá obter o
prazer que ele proporciona ao sentido da degustação, naquele momento não é um bem, ou seja, a inteligência distingue
que para o corpo ser saudável, precisa se alimentar melhor na hora do almoço,
desta forma não deve comer doce naquela hora.
Se o filho aprende desde cedo a renunciar um prazer para obter um
benefício maior, utilizando sua inteligência para dominar a sua vontade, quando
precisar renunciar as drogas, bebidas ou outros prazeres ilícitos, terá força
para fazê-lo e assim será realmente uma pessoa livre.
“Se é um pouco cansativo exercer a
autoridade deste modo, lembrem-se de que é para o bem dos filhos: a pior
tirania que os filhos poderiam vir a sofrer seria a incapacidade de se controlarem a si mesmos. Nada causa maior
angústia aos adolescentes do que sentirem-se incapazes de dominar algum aspecto
da sua vida.”[1]
A educação para a liberdade e autonomia supõe também uma educação para
os valores e para a verdade. “Cristo
revela, antes de mais, que o reconhecimento honesto e franco da verdade é a condição para uma autêntica
liberdade: ‘Conhecereis a verdade e a verdade vos tornará livres’(Jo 8,32) ”[2]. Para que os filhos
consigam distinguir o que é um bem
para eles, sua inteligência precisa ser alimentada com os valores corretos e
com a verdade e isso é tarefa primordial dos pais.
Os valores são “tudo aquilo que
nos ajuda a crescer em nosso ser, do físico ao espiritual, que contribui para
desenvolver nossas capacidades e qualidades, que nos enriquece interiormente,
que nos leva a sermos mais e a sermos melhores.”[3]Se
os filhos possuem os valores adequados, suas atitudes refletirão os valores que
possuem.
A verdade deve ser um dos maiores valores cultivados pela família. O
engano e a mentira podem destruir a família. Nunca se deve mentir para os filhos, pois a verdade um dia é
revelada e os filhos, então, não confiarão mais em seus pais. Não existe
mentira “inocente”, faltar com a verdade é sempre prejudicial. Mesmo que falar
a verdade possa ser mais trabalhoso para os pais, este cuidado é fundamental na
educação dos filhos.
Muitas vezes se observa que os pais mentem para os filhos simplesmente
para evitar ter trabalho ou para convencer os filhos a fazerem o que eles
querem e acreditam que uma “mentirinha” não faz mal para ninguém.
Exemplifica-se: a criança já comeu muito doce e continua insistindo por comer
mais. Os pais, ao invés de manterem-se firmes na posição de que ela não pode
mais comer porque fará mal a sua saúde e suportarem a insistência da criança,
mentem dizendo que o doce acabou. Desta forma, além da mentira, perdem a
possibilidade de educar a vontade do filho no sentido dele saber que o doce
está lá, mas não pode comer mais.
Outro exemplo é dizer para a criança que uma injeção que ela precisa
tomar não vai doer, para que a criança não faça “birra” e aceite mais
tranquilamente receber a injeção. No minuto que ela sentir a dor, que obviamente
acontecerá, passará a desconfiar da palavra dos pais e se sentirá enganada, o
que efetivamente aconteceu. O correto seria dizer que, sim, ela irá sentir um
pouco de dor, mas esta dor é necessária para o bem dela, pois o remédio ajudará
a melhorar.
Assim, a mentira nunca pode ser aceita, pois quebra a confiança entre
pais e filhos. Não é possível exigir do filho que não minta para os pais se os
próprios pais sempre mentiram para a criança, mesmo estas ditas “mentirinhas”.
É ensinamento bíblico: “O pai de
vocês é o diabo (...). Quando ele fala mentira, fala do que é dele, porque ele
é mentiroso e pai da mentira.”[4]Toda
vez que se diz uma mentira, está se comportando como filho do inimigo de Deus e
trazendo desconfiança e discórdia para dentro do lar.
A palavra chave para obter a verdadeira liberdade e autonomia é a
virtude da temperança.
“A temperança é a virtude moral que
modera a atração pelos prazeres e procura o equilíbrio no uso dos bens criados.
Assegura o domínio da vontade sobre os instintos e mantém os desejos dentro dos
limites da honestidade. A pessoa temperante orienta para o bem os seus apetites
sensíveis...”[5]
Portanto, não se trata de afastar todos os prazeres e abafar todos os
instintos, muito pelo contrário, a liberdade é alcançada na medida em que o
indivíduo encontra este equilíbrio entre o que pode e o que deve fazer em todas
as circunstâncias da sua vida, buscando o próprio bem e o bem daqueles que o
cercam, evitando que suas atitudes causem um dano físico, moral ou espiritual a
si mesmo ou ao próximo[6].
"Os pais são os primeiros responsáveis pela
educação de seus filhos. Dão testemunho desta responsabilidade em primeiro
lugar pela criação de um lar no qual
a ternura, o perdão, o respeito, a fidelidade e o serviço desinteressado são a
regra. O lar é o lugar apropriado para a educação
das virtudes. Esta requer a aprendizagem
da abnegação, de um reto juízo, do domínio de si, condições de toda liberdade
verdadeira. Os pais ensinarão os filhos a subordinar ‘as dimensões físicas
e instintivas às dimensões interiores e espirituais’”.[7]
[1] “Filhos: quando educá-los?”,
STENSON, James B. Pg. 41-42, 2ª edição, Editora Quadrante, São Paulo, 1994
[2] Carta Encíclica de João Paulo
II, Veritatis Splendor, No. 87
[3] “Uma educação integral baseada
em valores”, TOALDO, Olindo e Marilene, Série Educação 7, pg. 11, Sabta Maria,
1990
[4] Jo
8,44
[5]
CIC 1809
[6]
“Autodominio – Elogio da Temperança”, FAUS, Francisco, pg. 31, editora
Quadrante, São Paulo, 2004
[7]
CIC 2223
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